quinta-feira, 15 de dezembro de 2011

ASAS OU OÁSIS?




ASAS OU OÁSIS?

por Eugenio Santana


Guardo esses talismãs
raros, ocultos,
invisíveis, caros.
Não sei se asas
ou oásis.
A inesgotável fonte
do verbo-pássaro
é incomensurável?

Oásis: espaço, bússola, beleza, utopia.
Asas: almalada, aura, tempo, poesia.
As chaves do mistério
dessas raras jóias,
esqueci no mar profundo,
na distância.
joguei fora na embriaguez do tormento;
ficaram perdidas nas asas do esquecimento.

Não há fácil acesso
ao cofre de enigma-estigma.
Simplesmente invento
ao sabor do vento:
um poemazul – inventário de cicatrizes
alada memória do pássaro-poeta...

(*) extraído do meu livro: “Florestrela”
Hórus/9 Editora, Goiânia-GO, 2002

quarta-feira, 14 de dezembro de 2011

PARA SEMPRE JEAN-NICHOLAS ARTHUR RIMBAUD




RIMBAUD está vivo. Rimbaud é um fenômeno literário que não morrerá em nossa memória.
Rimbaud é um marco zero na história da Literatura.
Sua radicalidade, que o levou à renúncia e ao silêncio, merece um tributo especial e uma reflexão permanente.
Os poetas e os escritores do século XX, os surrealistas, os beatniks, os hippies, os jovens rebeldes – todos lhe são devedores.

SULCOS – À direita a aurora de verão desperta as folhas, os vapores, e os rumores deste meandro do parque, e as vertentes da esquerda mantêm em suas sombras violáceas, os mil velozes sulcos da úmida senda. Desfile de encantamentos. De fato: carros carregados de animais de madeira dourada, de mastros e telas pintadas de cores mescladas, no grande galope de vinte cavalos circenses jaspeados, e as crianças e os homens, nos mais surpreendentes animais montados; - vinte veículos, floridos e enfeitados como as carruagens antigas ou de contos, abarrotadas de crianças adornadas para uma pastoral suburbana; - e até mesmo, os ataúdes sob seus noturnos dosséis, erguendo os penachos de ébano, desfilando ao trote de grandes éguas azuis e negras.

Eu teria gostado de mostrar às crianças
Botos de ouro, peixes cantantes, polvos.
Escamas de flores ritmavam minhas danças,
Dos ventos tive asas e momentos de vôos.
Livre,ofegante, cavalgado por neblinas,
Eu que furava o muro dos céus avermelhados,
Que traz o que seria delícia dos poetas
Os liquens do sol e fungos celestiais;
Vi arquipélagos siderais e ilhas
Cujos céus delirantes abriam-se ao sonho.
Nessas noites sem fundo é que dormes e exilas
Milhão de aves de ouro, o futuro vigor?
Mas chega, chorei demais. Auroras não têm graça,
Toda lua é atroz e todo sol amargo;
O amor me encheu de torpores agridoces;
Que minha quilha estoure, que me faça ao mar!

(copydesk/fragment by Eugenio Santana – Escritor, jornalista, ensaísta literário)

sábado, 10 de dezembro de 2011

FAZ DE CONTA...




FAZ DE CONTA que vivemos num país muito lindo e verde, onde todos têm os mesmos direitos, todas as crianças têm lares felizes, todas vão à escola, todas têm a mesma assistência médica e alimentação. Vamos ainda fazer de conta que as cidades onde vivem essas crianças e seus pais são completamente livres de assaltos, assassinatos, acidentes de trânsito, catástrofes naturais, inundações, favelas, tráfico de drogas, políticos corruptos, sujeira, mendigos, gente morrendo nas filas de hospitais públicos, calor intenso em decorrência de abusos ambientais. Que os rios, riachos e córregos que cortam essa cidade são límpidos, cristalinos, prontos a nos matar as muitas sedes.

Vamos fazer de conta que as pessoas de idade são respeitadas e queridas, que sua experiência e sabedoria são apreciadas por todos, que as crianças são ensinadas a não discriminar ninguém, são ensinadas que todos têm o direito de ser o que realmente são e de se expressarem, de se vestirem como quiserem e amar a quem quiserem; que as famílias são unidas por laços verdadeiros e sinceros de afeto, senão não são famílias; que as doenças são curáveis, os frutos da terra são puros e não contaminados e que todos desejamos o bem dos outros. Que a paz reina no mundo, árabes e judeus se dão as mãos como irmãos que na verdade são, por exemplo, e que ninguém é menos amado pela cor de sua pele ou menos aceito por não possuir bens. Aliás, todos teriam os bens que a terra dá, igualmente, e todos dividiriam esses bens.

De qualquer forma, o Natal seria um momento de grande beleza e paz. Com um pouco mais de esforço, poderíamos imaginar Jesus bem bonitinho, no colo de sua mãe, nascendo o tempo todo dentro de cada coração.

(Copydesk/Fragment by Eugenio Santana)

quinta-feira, 1 de dezembro de 2011

TEU JARDIM, MÃE




Ínfima asa de memória ardente do poetalado, Mãe
Tão lúcida! E lancinante foi o sofrimento
e a dor inominável - e minhas lágrimas petrificadas...
Recente foi o teu Vôo na Asa inexorável do Tempo.

Partiu na tarde de nuvens cinzentas.
Meu coração? Partido; minha alma? Imolada...
Minha mãe partiu - viajou, etérea; diáfana, translúcida
Momento único em que não se repartiu - e não se fragmentou
A sua morte não repartiu – alçou íntegro e belo Vôo anímico
e cumpriu - bravamente - a sua Missão no "vale de lágrimas".

Afinal, viver é um jardim precário e efêmero.
Mas vejo em teu jardim
a perenidade da madressilva, miosótis, hortênsias,
rosas-vermelhas,samambaias e do jasmim.
Porque é bonito o Eterno.
E porque é lindo o Jardim.

Sim! O dia amanhece por meio da Aurora
inapelavelmente...

E nestas manhãs de outono
os vizinhos passam em frente da casa
e não te acenam mais.

Acenam para o jardim desolado
por hábito, medo da morte, perplexidade.
E pela sagrada Luz do Astro-rei
que ainda estremece
face ao teu (reen)canto.

Ainda assim, mãe
é noite em teu jardim cósmico.
Por mais que amanheça,
por mais que floresça
o meu olhar vaga -
lume...


(Eugenio Santana, jornalista, escritor)


"Para Sempre
Por que Deus permite
que as mães vão se embora?
Mãe não tem limite,
é tempo sem hora,
luz que não se apaga
quando sopra o vento
e chuva desaba,
veludo escondido
na pele enrugada,
água pura, ar puro,
puro pensamento.
Morrer acontece
com o que é breve e passa
sem deixar vestígio.
Mãe, na sua graça,
é eternidade.
Por que Deus se lembra
- mistério profundo -
de tirá-la um dia?
Fosse eu Rei do Mundo,
baixava uma lei:
Mãe não morre nunca,
mãe ficará sempre
junto de seu filho
e ele, velho embora,
será pequenino
feito grão de milho."

(Carlos Drummond de Andrade
- mineiríssimo como eu)

sábado, 26 de novembro de 2011

DETERMINAÇÃO




A diferença entre as pessoas comuns e as bem-sucedidas é que as pessoas que têm sucesso não ficam perdendo tempo discutindo suas limitações, elas as transcendem.

Recebem sua cota justa de obstáculos e continuam em frente apesar disso. Às vezes ficam machucadas e até feridas emocionalmente, mas se levantam e recomeçam.

O poder de realizar os próprios sonhos. A força de tornar real o objetivo. Algumas pessoas parecem ser predestinadas a marcar sua passagem por este planeta. Não pense que elas são beneficiadas pelo destino, ou escolhidas por uma “conspiração astral”.

Elas apenas ousam realizar. Você também pode ser assim. Quantos sonhos você deixou de realizar por não se sentir capaz? Como pode saber se é ou não capaz, se não tentar?

Gente bem-sucedida, não nasceu predestinada. Apenas ousou lutar por seus ideais.

O caminho de quem tem sucesso não é ou não foi fácil. Por vezes, os obstáculos foram tantos que a vontade de desistir foi maior, vencendo muitos que almejavam destaque.

Mas, para muitos, a realização foi plena e eles marcaram sua existência.

Não se abata com as dificuldades ou com o agouro de quem o desanima. Não escute aqueles que martelam ao seu ouvido que você não é capaz. Lute por seus sonhos determinadamente.

Determinação foi o que John F. Kennedy personificou em 1961, quando disse que colocaria um homem na Lua antes do final daquela década.

Determinação foi a força que levou Walt Disney a perseverar em construir seu sonho, apesar de ter de declarar falência por cinco vezes.

Eu sei que preciso usar a determinação dos outros como inspiração quando sinto que o vértice da gravidade me puxa para baixo e as coisas parecem difíceis demais.

Lembro-me: outras pessoas já fizeram isso e eu também posso fazer. Só preciso de determinação para continuar em frente.

“Ninguém pode construir em seu lugar as pontes que precisarás passar, para atravessar o rio da vida – ninguém exceto tu, só tu.”

(Copydesk/fragment by escritor/jornalista Eugenio Santana)

quarta-feira, 23 de novembro de 2011

TEMPO DE CRISÁLIDA (*)




É preciso transpirar uma nova realidade para poder vivenciá-la. Enquanto não nos posicionarmos e não fizermos a escolha, viveremos no mundo que não escolhemos. E nem desejamos. Este é um momento de con-vocação, de re-união, de re-construção. O chamado já está sendo feito; que possamos atendê-lo e nos seja dado o privilégio de nos tornarmos a mudança que queremos ver no mundo, como nos ensinou Mahatma Gandhi.

É preciso deixar morrer. É preciso aprender a liberar o que já não é mais. Há partes de nós que resistem, apesar de obsoletas. Que certezas carregamos sem questionar?

Onde estão nossas dificuldades de aceitação que não nos permitem sair do sofrimento?

Há tempo para tudo na vida. Mas é preciso deixar morrer a lagarta. A semente do que fomos e as ilusões nas quais construímos nossa visão de mundo foram uma etapa necessária da existência, mas chega o momento da transformação. Aquilo que era bom não representa mais o futuro.

A segurança não pode ser medida pela convicção, mas pela habilidade de duvidar e, mesmo assim, ser capaz de seguir em frente. A lagarta é a promessa do que podemos nos tornar; contudo, não é a experiência completa nem um fim em si mesma. É uma etapa inicial, acertadamente percorrida. A infância da vida, o desabrochar da inocência, a experimentação da realidade.

Então há o momento de deixar a lagarta morrer. Esse é o tempo da crisálida. Quando saímos das certezas aprendidas para as verdades elementares. Introjetamos a experiência e repassamos a vida pelo crivo caloroso da essência. Existe alegria, júbilo nessa vivência, pois não há nada melhor do que renascer. Nascer pode não ser uma escolha, mas renascer é fruto da consciência que acorda e deixa morrer aquilo que não vive mais.

Claro que, como qualquer das passagens da existência, tornar-se crisálida não é uma experiência isenta de tumulto. Há estertores da antiga lagarta que resiste em desaparecer, sem compreender que de fato se transforma em algo maior e melhor. A crisálida contém a lagarta, mas vai muito além dela.

Essa interiorização a que a crisálida convida é um estado reflexivo, de harmonização entre o ser e o fazer, entre o desejo e o destino. É a edificação da consciência em estado de maturidade. É, ao mesmo tempo, um estado de insensatez, de loucura, de fazer coisas inesperadas, fora do senso comum. É preciso muita maturidade para enlouquecer de forma sensata.

Loucura mesmo é permanecer lagarta. Arrastar-se por aí, sem perceber a magnificência da vida. Acordar e dormir sem perceber que o tempo entre esses dois momentos é o mais significativo. Não será em nenhum outro dia, nenhum outro momento e nenhum outro lugar. Especialmente, não precisamos ser outra pessoa para nos transformarmos.

O ser que somos já basta. É preciso lembrar que a lagarta é semente e que a experiência acumulada é a matéria-prima na qual podemos construir o casulo que vai abrigar a crisálida.

É tempo de se voltar para o interior, a essência. Um momento de recolhimento das distrações do mundo. O sabático do cotidiano. Na aparência, aos olhos apenas focados no exterior, a crisálida é um casulo de morte. É o fim da lagarta e nada mais se vê.

Não há beleza nem movimento, nenhum tipo de ação. É o fim de um ciclo, mas não se pode adivinhar o que virá daí. É preciso aprender a confiar no fluxo, acreditar no sábio processo da natureza, que fará revelar aquilo que pode ser.

Muitos observadores desavisados vão condenar a crisálida. Vão apontar suas deficiências, suas perdas, suas dificuldades, sua fragilidade. Contudo, não se pode confiar na impressão das outras lagartas. Cada uma delas também haverá de experimentar o mesmo processo, cada uma a seu modo, porém lagartas não estão prontas para compreender a crisálida.

O que é uma aparente deficiência pode ser, de fato, um redimensionamento da experiência de existir. O que é percebido como perda pode, na verdade, ser um desapego libertador. As dificuldades nada mais são do que a consciência em pleno exercício, percebendo mais e, portanto, experimentando coisas e situações novas. É do falsamente frágil que surge a força, o vigor, a vida.

Por falta de experimentação, o vocabulário das lagartas condena a experiência de crisálida.

A resistência se organiza, a crítica se intensifica, mas o processo não pode mais ser interrompido. Uma vez que a lagarta comece a se transformar, já não há mais volta. E é desse recolhimento, dessa autoimolação do passado que surgirão as condições para o desabrochar de uma nova experiência, mais ampla, mais rica, além de qualquer aspiração.

Da antiga lagarta se tem a experiência do corpo. Dos desafios vividos nascem as antenas da percepção. Da entrega surgem o veludo e as cores. O ser se apresenta além das restrições e, de par em par, desdobra suas asas e se permite voar para esse lugar mítico chamado felicidade.

É para lá que estamos todos fadados a seguir.


(*) Eugenio Santana é escritor, jornalista, ensaísta, publicitário, copydesk, versemaker, editor. Autor de livros publicados.

BLUE FISH




BLUE FISH (*)


- Eugenio Santana


O peixe Azul e cego
nada nas águas escuras
do Oceano.
Refém de si mesmo.

Sabe que o êxtase existe,
mas é melhor apreciá-lo
após intermináveis vivências
com a Dor.

O peixe azul e cego
nada, rumo ao nada.
Vive fragmentado, ameaçado, acossado.
Mapas e bússolas
são indicadores de seguras rotas?
Inúteis para os peixes
Azuis e cegos.
Embora roteiro de navegação
não garante travessia
de luz ou sombra.

Ainda que o remédio seja amargo,
a aceitação do sabor
é a lição do amor.

E o peixe Azul?
NADA...



(*) Extraído do meu livro “FLORESTRELA”.
Hórus/9 Editora, Goiânia-GO, 2002, página 20.

sábado, 19 de novembro de 2011

O SOL CONTINUA BRILHANDO...




DEUS é como o sol, simplesmente brilha. Dá seu calor e sua luz. Bem, podemos ficar ao calor e à luz do sol, ou podemos afastar-nos dele. Mas, quando nos afastamos, sabemos que ele não deixa de existir. O sol continua brilhando. Podemos sair do sol, trancar-nos numa masmorra escura onde ele não pode nos alcançar. Podemos ficar escuros e frios ali, mas sabemos que o sol não muda. Nós é que mudamos. Mas também sabemos que sempre podemos voltar para a luz do sol. Ela sempre está ali à nossa disposição. É a mesma coisa com o amor de Deus. Ele é incondicional – cósmico – constante e permanente. É como a luz e o calor do sol. Está sempre ali ao nosso alcance.

Às vezes, acho que DEUS é algo semelhante a uma tomada elétrica. Há uma força imensa que pode ser captada por meio de uma tomada elétrica. Há força suficiente para iluminar uma sala, para aquecer um cômodo, para fazer tocar música ou mostrar as imagens da TV. E a tomada, a forma de nos conectar com o poder de DEUS, é a FÉ. A Fé é o canal para estabelecer nossa ligação com DEUS. É nossa Fé que liga a tomada e libera o poder de DEUS.

(por Eugenio Santana, escritor, jornalista)

terça-feira, 15 de novembro de 2011

O TEMPO NÃO PÁRA NO PORTO, NÃO APITA NA CURVA, NÃO ESPERA NINGUÉM




Viktor D. Salis, filósofo grego contemporâneo, nos remete à sabedoria eterna de Sêneca, que falou do tempo e da arte de viver em serenidade: “O tempo se contrai na mesma proporção em que não temos tempo para nós mesmos e para a vida. Daí advém essa intranqüilidade de alma e essa angústia – ou neuroforia – de que o tempo passa sem que tenhamos tido tempo para viver. Mais uma vez somos nós que arrebatamos de nós mesmos esse bem precioso e único chamado vida: e ela, mais que ninguém, exige tempo para gastar. Assim, sempre ocupados, fugimos da inovação, caímos na monotonia e não vivemos como queremos, mas do modo como as circunstâncias nos conduzem. Nossas intensas preocupações são disfarces para nos subtrairmos da vida, porque não suportamos a solidão, o abandono de nós mesmos, o ostracismo, e até a nossa própria casa.

Intoleráveis aos outros e a si próprios talvez sejam os viciados em trabalho, os que abriram mão da alegria e da naturalidade, renunciando às alegrias do viver em harmonia com os dias pássaros que passam – voando com as asas do tempo, as pessoas, coisas e elementos da natureza. Assim, a vida nos abandona, em meio aos preparativos para a vida melhor, que sempre colocamos em um futuro hipotético, jamais no lugar em que estamos, ou nas situações de vida que nos chegam. E a suposta vida boa, que projetamos na realização de desejos de consumo de coisas ou pessoas, quando vem, chega muito tarde, quando já não temos saúde para desfrutar daquilo que tanto ambicionamos. De que adianta estarmos abastados, estando velhos e acabados, tendo de gastar com médicos e exames aquilo que foi miseravelmente tirado à vida real, que perdemos por não percebê-la...

Salis nos lembra: já na Roma antiga Sêneca vivia a vida frenética de uma metrópole, e sabia do quanto perdemos de vida, ao criar tempo psicológico em nossas mentes caóticas pela vertigem das insaciáveis necessidades: “Na verdade, não é curto o tempo que temos, mas longo o seu desperdício. Somos esbanjadores do tempo e da vida em idiotas, estéreis e inúteis atividades. Quando temos tempo, encontramos formas de anestesiar-nos, para não pensarmos muito e não encontrar meios de recriar nossas vidas com o tempo de que dispomos. Assim, bebemos e comemos em excesso, ou nos cuidamos em demasia.”

Sim, por toda parte, nos outros e em nós mesmos, está escrito que somos pródigos em desperdiçar o tempo, sendo ele a única coisa – embora ilusória – em relação à qual deveríamos ser muito avarentos. Se o tempo tanto salva quanto mata, devemos gastá-lo com sabedoria.

(por EUGENIO SANTANA, jornalista, escritor)

segunda-feira, 7 de novembro de 2011

O TIGRE E EU




“A FERA” – Guardo, sob a cama, um tigre. Quem me visita cobre-se de espantos. Mas não sou dado a delicadezas. O tigre anda solto pela casa. Trata-se de um animal insaciável, inteligentemente feroz, preciso como a equação de Schrödinger.

Acontece que sou de inusitadas atitudes. Ao despertar, encharco-me de chocolate quente e torradas besuntadas de geléia de damasco. O tigre observa. Antes do almoço, leio os jornais. O tigre observa. Ao entardecer, estiro as pernas num pufe revestido de veludo e ouço músicas clássicas e new age. O tigre observa. Faço de conta que o ignoro ai tão próximo de mim, majestosamente sentado no tapete. Mas eu também o observo. Esta permuta de nosso diálogo mudo.

De tanto observá-lo, descobri o segredo capaz de explicar por que os tigres se encolhem em gatos...

(by Eugenio Santana – fragment/copydesk)

quarta-feira, 2 de novembro de 2011

NÓS SOMOS O QUE FAZEMOS...




NÓS SOMOS O QUE FAZEMOS – não somos o que pensamos nem o que dizemos ou o que sentimos. “Nós somos o que fazemos”.

Quantas vezes nos sentimos traídos e surpresos ao constatar a distância entre o que as pessoas dizem e o que fazem. Levamos tempo para prestar atenção nos atos do que nas palavras, e muitos não aprendem nunca.

Muitos têm medo de se arriscar e preferem se acomodar no que é menos desafiador, mais previsível e repetitivo. Isso explica por que o tédio é uma característica do nosso tempo.

Os três componentes da felicidade são: algo para fazer, algo para amar e algo para desejar. Se nos dedicarmos a um trabalho útil, um relacionamento harmonioso e uma expectativa de prazer, será difícil ser infeliz. Trabalho pode ser qualquer atividade, remunerada ou não, que nos faz sentir realizados. Se temos uma ocupação apaixonante que dá sentido à nossa vida, esse é o nosso trabalho. As ocupações podem ser tão diversas quanto à natureza humana, o fundamental é que causem prazer e dêem sentido à vida.

terça-feira, 1 de novembro de 2011

VAI, SEGUE, VOA, ACREDITA!




Do lado de um imenso muro de pedras voava um pássaro, como sempre sozinho, pensando na sua eterna solidão.Do outro lado do mesmo muro outro pássaro também voava e lamentava o seu interminável isolamento. Mas do alto de uma nuvem, bem acima de qualquer muro, dois anjos observavam a cena. Um dos anjos comentou:- Veja que maravilha! Que sincronismo de vôo! Isto é o verdadeiro amor. O outro anjo questionou:- Será que eles nunca se encontrarão? O primeiro anjo respondeu:- É claro que sim. Olhe, lá adiante, o fim do muro. Todo muro tem um fim. E completou:- Mas se eles se arriscassem a voar mais alto, acima do muro, poderiam se encontrar hoje mesmo. QUE VOCÊ CONSIGA SE DESAPEGAR DAQUILO QUE TE APRISIONA E OUVIR A VOZ DO TEU CORAÇÃO, POIS ELE É A BÚSSOLA QUE TE APONTARÁ O CAMINHO.

VAI, SEGUE, VOA, ACREDITA!

segunda-feira, 10 de outubro de 2011

À BEIRA DO RIO DOS TEMPOS, NARCISO DETÉM-SE




Narciso era belo à perfeição e, por isso, era casto. Por estar enamorado de si mesmo, desdenhava as Ninfas. Brisa alguma agitava a fonte, onde Narciso, o dia todo, debruçava-se, tranqüilo, a contemplar sua imagem...

Conheceis a história. Por isso nós a diremos de novo. Todas as coisas já foram ditas, mas como ninguém as escuta, é preciso recomeçar sempre.

Não há mais ribanceira nem fonte: metamorfose ou flor que se mire. Não há nada senão o solitário Narciso, um Narciso apenas sonhador, fechado numa pose de escultura. Ele se inquieta com a inútil monotonia da hora, e, indeciso, seu coração se interroga. O que ele quer, enfim, é saber a forma da sua alma. Se julga por seus demorados estremecimentos, ele sente que ela deve ser adorável em demasia. Seu rosto, porém! Sua imagem! Ah! Não saber alguém se se ama... não conhecer a beleza em si mesmo! Eu me confundo nesta paisagem sem linhas que não contraria seus planos. Ah! Não poder se ver! Um espelho! Um espelho! Um espelho! Um espelho!
E Narciso, que não duvida que sua forma não seja uma porção qualquer, ergue-se e sai à procura dos cobiçados contornos para, enfim, dissimular sua grande alma.

À beira do rio dos tempos, Narciso detém-se. Riacho fatal e ilusório no qual passam e escoam-se os anos. Margens singelas de tosca moldura onde a água se contém como um espelho sem aço, no qual nada se veria por trás, ou por trás do qual o tédio abriria suas asas. Canal morno, letárgico, espelho quase horizontal. Nada poderia distinguir do ambiente descolorido essa água tépida, se não sentíssemos que ela flui.

De longe, Narciso tomou o rio por um caminho. E como se entediava, completamente só nessa embriaguez, aproximou-se para ver passarem as coisas. Com as mãos na moldura, inclina-se agora na postura tradicional. E eis que, na água, porque ele mira, matiza-se, de repente, delicada semelhança.

Flores dos rios, troncos das árvores, fragmentos de céu azul refletidos, tudo numa fuga de rápidas imagens que apenas o aguardam para existir, colorindo-se à vista de seu olhar. A seguir, abrem-se as colinas e as florestas se repartem ao longo dos vales – visões que ondulam ao capricho das cores das águas, e que as ondas diversificam. Narciso olha muito admirado. Mas não compreende bem por que uma e outra se agitam, seja porque sua alma dirige a onda, seja porque a onda a direcione.

Para onde Narciso olha, eis o presente. Do futuro mais recuado, as coisas ainda latentes apressam-se para o ser. Narciso as vê, porque elas passam; esvaem-se no passado.em breve, Narciso conclui ser sempre a mesma coisa. Ele interroga; depois, reflete. Passam sempre as mesmas formas; só o arrebatamento da onda as diferencia.

Por que são tantas; ou antes, por que são as mesmas? Em sendo imperfeitas, recomeçam sempre... e todas elas, pensa ele, esforçam-se e, com força, atiram-se de encontro a uma primeira forma perdida, paradisíaca e cristalina.

Narciso sonha no paraíso.

(copydesk/fragment by Eugenio Santana)

sábado, 1 de outubro de 2011

O RETORNO DO HOLANDÊS VOADOR




O RETORNO DO HOLANDÊS VOADOR


por Eugenio Santana, FRC


Ouve a concha do tempo,
Ouve a voz silente do vento
nas Asas da Memória.
Não há como conter essas águas.
Sementes de mostarda levitam
O casco da Nave ou do Navio?
Fantasmas somos todos, nós.
Nua Utopia desfila cores e presságios
sobre a perplexidade desses seus olhos astutos.
Avante, comandante!
Não existem piratas à vista.
A vitória, o triunfo e a glória
insinuam-se e se mostram
antes mesmo de a guerra começar.
Ele voltou.
Há vestígios de luz
nos mistérios da vastidão do Mar.
O Holandês Voador voltou.
Atracou no cais do porto de sualma
e fotografou suaura.
Um pergaminho revela
aonde encontrar a chave
que abre o Solar
do conhecimento de Rama.
Não há náufrago no convés.
Ao timoneiro, alada mão se eleva
e firme, comanda.
Navios navegam mares.
Obscenos são aqueles
que ficaram no cais.
Obscuros, não assimilaram
a grandeza dos Oceanos.


(*)Fonte: extraído do meu livro “FLORESTRELA”
Hórus/9 Editora, Goiânia-GO, 2002.
Dedicado ao publicitário, músico e poeta
Alcimar Fernandes Pereira (em memória)

sábado, 10 de setembro de 2011

BAUDELAIRE: CONSIDERADO O CRIADOR DA LÍRICA MODERNA




Charles-Pierre Baudelaire nasceu em Paris, a 9 de abril de 1821, e faleceu na mesma cidade, a 31 de agosto de 1867. Desde muito jovem demonstrou possuir um temperamento inquieto e rebelde, que lhe valeu a expulsão de um dos colégios em que estudou. Em razão de seu comportamento boêmio foi enviado pelo padrasto, em 1841, à Índia. Viagem que não foi concluída, pois o jovem poeta conseguiu retornar à França antes de chegar ao seu destino.

Ao atingir a maioridade, em 1842, Baudelaire recebeu a herança paterna e passou a levar uma vida desregrada fortemente associada ao álcool e às drogas. Data desse período o início de seu rumoroso relacionamento com Jeanne Duval, a mais famosa e importante de suas amantes, que lhe inspirou muitos dos seus mais belos poemas amorosos.

Com seu estilo de vida, Baudelaire dilapidou rapidamente a herança paterna, o que fez com que a sua mãe o acusasse judicialmente de pródigo e conseguisse a nomeação de um tutor para administrar seus bens. O poeta manteve até a morte uma relação tensa e conflituosa com esse administrador de suas rendas.

Em 1857, foi lançado seu livro de poesia mais famoso, “As Flores do Mal”, que produziu enorme escândalo na França. Novamente Baudelaire foi processado e obrigado a pagar, junto com os editores, uma pesada multa. A acusação feita era de ataque violento à moral. Outros livros importantes de Baudelaire são “Os Paraísos Artificiais” (1860) e “Os Pequenos Poemas em Prosa (1868), depois intitulado “Spleen de Paris” (1869).

Paralelamente a sua produção poética, Baudelaire foi também crítico de arte e tradutor. Destaque para seu trabalho relacionado à obra do escritor estadunidense Edgar Allan Poe, que exerceu forte influência sobre suas concepções.

Baudelaire foi considerado pela crítica literária o fundador da lírica moderna, pois sua obra incorporou, como nenhuma outra poesia produzida até então, os elementos considerados, em princípio, como não-poéticos. Ele assimilou elementos pouco ortodoxos para entender, por meio de seus escritos, as enormes contradições que estão na base da vida moderna, cujo epicentro, no século 19, era Paris.

A MUSA VENAL


Ó musa de minha alma, amante dos palácios,
Terás, quando janeiro desatar os ventos,
No tédio negro dos crepúsculos nevoentos,
Uma brasa que esquente os teus dois pés violáceos?

Aquecerás teus níveos ombros sonolentos
Na luz noturna que os perigos deixam coar?
Sem um níquel na bola e seco o paladar,
Colherás o ouro dos cerúleos firmamentos?

Tens que, para ganhar o pão de cada dia,
Esse turíbulo agitar na sacristia,
Entoar esses Te Deum que nada têm de novo,

Ou, bufão em jejum, exibir teus encantos
E teu riso molhado de invisíveis prantos
Para desopilar o fígado do povo.

(Por Eugenio Santana – Escritor, Jornalista e Ensaísta literário. Autor de livros publicados. Integrante de mais de 30 instituições culturais do Brasil e de Portugal. Ex-Superintendente de Imprensa no Rio de Janeiro.)

sexta-feira, 9 de setembro de 2011

NEVERMORE: TRANSCENDÊNCIA DO VERBO NAS ASAS DA PERMANÊNCIA




Por que razão o ser humano é levado a tomar da pena e do papel (ou de seus substitutos contemporâneos) e realizar a atividade aparentemente gratuita e inútil que é escrever um poema? Em outras palavras, que necessidade visceral é essa que leva o homem a extrair de si um produto que não tem nenhuma função prática para sua sobrevivência, a exercer a difícil e pouco apreciada atividade de criar poesia com palavras? Entre os homens que exerceram a faculdade da criação poética em verso e prosa e que pagaram por ela o preço da incompreensão e do ostracismo, destaca-se o estadunidense Edgar Allan Poe (1809-1849).

Poe obviamente entendia as profundezas dessa necessidade tão inexplicável. Talvez percebesse que o homem faz poesia para melhor entender a si e ao mundo em que vive. Ou para fantasiar outros modos de existência que não o seu, outras realidades para além desta, insatisfatória, com a qual tem de haver-se. Ou para atenuar sua sensação de impotência em relação à natureza, que lhe é indiferente. Ou ainda, como diria o crítico de arte Étienne Souriau (1892-1979), “para ensinar aos deuses como é que se cria”.

O verdadeiro poeta não usa a palavra apenas para representar os elementos da realidade empírica; ele instaura o representado, como imagem e som, às sensações do seu receptor. Quando o poeta enuncia, sua palavra forja e ressignifica a realidade à sua vontade. E Allan Poe era um mestre desse processo criativo.

Seu poema “O Corvo” é um dos mais comentados do mundo como exemplo de microcosmo estético perfeitamente acabado, de composição ao mesmo tempo cerebral e inspirada, na qual a vida e a morte encontram-se intensamente presentes e igualmente misteriosas.

O poema conta uma história fantástica: a de um rapaz que está lendo em seu quarto, na tentativa de esquecer a morte recente da amada, quando, de repente, é perturbado pelo som de uma batida à janela. Ao abri-la, ele nada mais vê além da treva noturna e volta ao quarto. Mas novamente ouve a batida e volta a abrir a janela. Nisso, entra-lhe um agourento corvo pelo recinto e vai pousar num busto de Palas que está em cima da porta.

Então o rapaz tem a idéia de perguntar o nome ao corvo, que lhe responde: “Nevermore” – Nunca mais. A princípio, o rapaz se ri do papaguear sem sentido da ave. Mas, aos poucos, movido por sua dor, dá seguimento ao diálogo, num jogo de ecos: passa a formular perguntas que, num crescendo de agonia, exprimem as dúvidas que tem na alma – se ele algum dia será capaz de esquecer a amada e se virá a vê-la uma vez mais.

A tudo isso a profética ave sempre responde monocordicamente: “Nunca mais”. Exaltado, então, o herói ordena-lhe que desapareça. Mas o corvo volta a responder “nunca mais” e lá permanece pousado, assombrando para sempre o desiludido rapaz.

Contar uma história é fácil. Para construir uma história, basta seguirmos os preceitos formulados, já nos anos 300 a.C. por Aristóteles: configurar uma situação, uma complicação e uma resolução. Mas contar bem uma boa história e carregá-la de poesia já é mais difícil.

A sinopse acima não corresponde, nem de longe, a “O Corvo” de Poe. Ela não constrói paulatinamente o suspense claustrofóbico do poema, os sons encantatórios e hipnóticos que sustentam a obsessão do amante masoquista. Ela não prende o leitor, como o corvo prende a personagem, no círculo da atemporalidade em que o homem se debate com sua impotência diante da morte. Seu ritmo não faz acelerar o batimento de um coração angustiado, como ocorre na caixinha de ressonâncias que é o comovente poema de Poe. Nessa sinopse, o som e o sentido não se conjugam para levar a palavra a ultrapassar sua mera referencialidade e criar no leitor a emoção pretendida – a mesma do amante torturado pela lembrança sem fim do amor ausente.

(copydesk/fragment by Eugenio Santana – Escritor, jornalista e ensaísta. Ex-superintendente de Imprensa no Rio de Janeiro.)

O RETRATO DE DORIAN GRAY: OSCAR WILDE PINTOU COM PALAVRAS UM MAGISTRAL QUADRO DA DECADÊNCIA MORAL HUMANA




Filho de William Wilde, médico de renome, e de Jane Francesca Elgee, escritora e intelectual, ativa militante do movimento para a Independência da Irlanda, desde cedo o irlandês demonstrou seu gênio. Aluno brilhante, ganhou vários prêmios por seu destacado desempenho escolar em renomadas instituições de ensino. Sobressaia-se dos demais estudantes tanto por seu temperamento forte e anticonvencional, como também por sua refinada inteligência.

De 1879 a 1889 concentrou a maior parte de sua produção em textos teatrais e poemas que alcançaram relativo sucesso. Versátil e de talento pluralista, publicou também um volume de contos de fadas, “O Príncipe Feliz e Outras Histórias” (1888), e um ensaio intitulado “A Alma do Homem sob o Socialismo” (1891). Em 1890 saiu a primeira versão daquele que seria seu único romance, “O Retrato de Dorian Gray”. Com a edição revisada, de 1891, o livro alcançou notável repercussão, sendo até hoje a obra mais conhecida de Wilde.

“O Retrato de Dorian Gray” parece prenunciar o drama pessoal vivido por seu autor. Há uma tensão evidente na relação que une o belo jovem Dorian, Basílio Hallward (o pintor do retrato), e Lorde Henry Wotton, principais personagens da obra. Essa tensão se desenvolve a partir do fascínio que Dorian exerce sobre seus amigos, trazendo subjacente uma sutil atração homoerótica.

O pintor, de temperamento reservado e austero, vê na beleza cândida de Dorian a personificação de seu ideal artístico, identificando a perfeição de seus traços físicos com a pureza de sua alma. Já Lorde Henry é o alter ego de Wilde, e com sedutora loquacidade expressa sua expectativa em relação a Dorian:

“Viva! Viva a maravilhosa vida sua! Busque sempre novas sensações. Que nada o atemorize... um novo hedonismo – é disto que precisa o nosso século... todos nós nos convertemos em horrorosos fantoches, alucinados pela lembrança das paixões de que tivemos demasiado temor, e das esquisitas tentações a que não tivemos coragem de ceder. Juventude! Não há absolutamente nada no mundo, senão a juventude.”

“O Retrato de Dorian Gray” permanece como uma das grandes obras-primas da literatura universal. O livro foi publicado no Brasil por várias editoras, entre elas, a Nova Cultural (1993). Intrigante e de uma moralidade dúbia, como seu controverso autor, que terminou seus dias de forma melancólica.

(copydesk/fragment by Eugenio Santana – Escritor, jornalista, ensaísta. Ex-Superintendente de Imprensa no Rio de Janeiro.)