quinta-feira, 29 de outubro de 2020

EXPLORADO OS CHEIROS, A MULHER PASSA AOS SABORES (*)

O primeiro aspecto explorado pela mulher no corpo do homem, o primeiro que ela percebe é o cheiro. O cheiro é determinante. Quase sempre baseada no cheiro ela decide se continua a ver aquele homem ou se o evita. Evita-o porque ele é desagradável, porque lhe dá náuseas. Sente-lhe o cheiro à distância, basta ele estar sentado dá náuseas. Sente-lhe o cheiro à distância, basta ele estar sentado ao lado, no trem, no metrô, no avião, no carro, no restaurante, numa sala ou no elevador. Mais determinante ainda é o hálito do homem, porque se o cheiro pode ser modificado por meio de desodorantes e perfumes, o hálito, não. A mulher, quase institivamente, faz de tudo para senti-lo. Para descobrir, basta aproximar-se. Às vezes, ela o faz de propósito, aproxima-se o mais possível como quando, por exemplo, tenta ajustar-lhe a gravata. Os homens apreciam esse gesto, esse tipo de atenção. O cheiro do corpo e do hálito são uma condição "sine qua non" para o prosseguimento da relação. Se o cheiro é bom, ela pode continuar. A mulher experiente sabe também intuir, pelo cheiro do corpo e do hálito, o cheiro do sexo. A relação entre corpos e odores é uma ciência cultivada pelos criadores de perfume. A arte de criar perfumes é uma arte erótica. Nasce da profunda consciência da psique feminina e das metamorfoses do odor natural do corpo da mulher misturado ao perfume. O mesmo perfume assume fragrâncias diversas em mulheres diferentes. Os perfumistas são grandes cultores do corpo feminino. Explorado o cheiro, a mulher passa aos sabores. Esse ato cognitivo necessita de um início erótico, o beijo. No homem, ao contrário, é com o beijo que começa a exploração, porque antes não conseguia perceber o cheiro da mulher, mas apenas seu perfume artificial. Com o beijo, sente seu hálito e, às vezes, uma reação de desagrado. O homem, porém, não dá a essa sensação a mesma importância que a mulher. Se está excitado eroticamente, deixa de sentir o cheiro desagradável. No homem o hálito é apenas um obstáculo, jamais uma barreira. Para a mulher o sabor da boca é tão determinante quanto o cheiro, ou mais ainda. O beijo é uma maneira de começar a oferecer algo do próprio corpo e de tomar alguma coisa. É um iniciar a beber o corpo do homem. Pelo modo de beijar, a mulher experiente deduz o caráter do homem. Por particularidades insignificantes. Percebe, por exemplo, se no ato sexual é capaz de esperar longamente, de adiar o próprio orgasmo, ou então se tem ejaculação precoce. Se é generoso e capaz de dar-se ou se, ao contrário, é um ladrão de prazer. Num beijo a mulher descobre muitas outras características do homem, como por exemplo se é inteligente e sensível. A maneira como o faz, porém, guarda-a para si, não o diz. Não o dirá jamais, principalmente a quem não compreenderia. É um saber antigo, iniciático, que poderia ser julgado obsceno, que requer cumplicidade, reserva. Uma mulher não falará dessas coisas a uma jovem que jamais tenha estado profundamente apaixonada. Assim como jamais falaria de erotismo com um rapaz. Se quiser transmitir-lhe algum saber, fará amor com ele. Pelo conhecimento do corpo do homem, uma mulher sabe também avaliar as outras mulheres. Ouvindo uma mulher falar, observando-lhe as mínimas atitudes, sabe se está apaixonada ou não, sabe se aceitou o corpo do seu homem ou não. Sabe se o seu é um verdadeiro e grande amor ou apenas um sentimento de posse, de proteção ou de prevaricação. A mulher conserva, em todos os instantes de sua relação amorosa, a capacidade de percepção e avaliação. O homem, não; quando está excitado eroticamente, perde ainda o pouco de perspicácia que possui. Fica dominado por uma única emoção e não está mais em condições de dizer se aquela mulher é feia ou bonita, gorda ou magra, se tem seios fartos ou apenas esboçados. As mulheres ficam espantadas e perturbadas quando ouvem dizer que seu homem teve relações com uma mulher que, a seus olhos, é muito feia, até mesmo repulsiva. É que na excitação erótica o homem gosta de tudo, assim como se lhe apresenta. Porém, quando a excitação desaparece, desaparece também a impressão de beleza. Para alguns homens, é exatamente como o despertar de um sonho. Encontram-se ao lado de um corpo estranho, tão diferente do seu, incrivelmente pequeno, ou incrivelmente gordo, e ficam espantados. A admiração do homem pela mulher bonita vista ocasionalmente é, em geral, efêmera. O olhar erótico é facilmente excitável, mas é também volúvel. Na maioria das vezes os homens não são profundamente atingidos pela particular beleza de uma mulher, não se deixam perturbar por ela. Claro que não poupam elogios, mas porque gosta daquele vestido, o penteado é original, porque a mulher é agradável. É no desenvolvimento da relação erótica que o homem descobre em sua mulher a perturbação provocada pela beleza. De repente vê, quando não havia visto antes. É uma comoção poética que lhe provoca um grito maravilhado e de reconhecimento. No amor o milagre se repete uma segunda vez, depois uma terceira, depois a cada encontro. Cada vez um detalhe, cada vez a desconcertante experiência da perfeição. Também a mulher sente essa emoção olhando seu homem, mas a experiência do homem é mais violenta. Assemelha-se à maravilha do reconhecimento de uma mãe, que, encantada, olha o filho de dois anos. E, de fato, a beleza da mulher amada sempre se assemelhou, aos olhos do homem, às das crianças, suscita a mesma ternura, até um sentimento de fusão. O grande erotismo é possível somente entre um único homem e uma única mulher que levam ao extremo o que é específico do próprio sexo e do sexo do outro. Tem-se então a interminável aparição do novo. Aquilo que num capítulo precedente chamamos de "algo mais". A mulher jamais encontraria o algo mais sozinha, mas apenas um êxtase contínuo, cíclico, recorrente. O homem não encontraria nunca o algo mais sozinho, mas apenas o diverso. O algo mais é a revelação do novo no contínuo, no que já é. O novo torna-se então um acréscimo, um enriquecimento. Só o que existe, o que tem duração e continuidade pode aumentar, tornar-se maior. Mas somente o que é descontínuo pode ser confrontado, comparado, recordado. É a união do contínuo com o descontínuo que cria a identidade e, assim, a possibilidade de crescimento, a tensão para o alto, em direção à perfeição. (*) EUGENIO SANTANA é Escritor, Jornalista, Gestor editorial, Ensaísta, Redator publicitário, Poeta, Blogueiro, Biógrafo, Romancista, Agente literário. 11 livros publicados e 3 no prelo. Autor, entre outros, de "Ventos Fortes, Raízes Profundas", autoajuda, Madras editora. Contato: (62) 9.8154-9077 WhatsApp

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