sexta-feira, 25 de maio de 2018

LÍRICAS REIVINDICAÇÕES DOS HOMENS (*)

Que quando chego do trabalho ela largue por um instante o que estiver fazendo - filho, panela ou computador - e venha me dar um beijo como os de antigamente. Que quando nos sentarmos à mesa para jantar ela não desfie a ladainha dos seus dissabores domésticos. E se for uma profissional, que divida comigo o tempo de comentarmos nosso dia. Que se estou cansado demais para fazer amor, ela não ironize nem diga que "até que durou muito" o meu desejo ou potência. Que quando quero fazer amor ela não se recuse demasiadas vezes, nem fique impaciente ou rígida, mas cálida como foi anos atrás. Que não tire nosso bebê dos meus braços dizendo que homem não tem jeito pra isso, ou que não sei segurar a cabecinha dele, mas me ensine docemente se eu não souber. Que ela nunca se interponha entre mim e as crianças, mas sirva de ponte entre nós quando me distancio ou me distraio demais. Que ela não me humilhe porque estou ficando calvo ou barrigudo, nem comente nossas intimidades com as amigas, como tantas mulheres fazem. Que quando conto uma piada para ela ou na frente de outros, ela não faça um gesto de enfado dizendo "Essa você já me contou umas mil vezes". Que ela consiga perceber quando estou preocupado com trabalho, e seja calmamente carinhosa, sem me pressionar para relatar tudo, nem suspeitar de que já não gosto dela. Que quando preciso ficar um pouco quieto ela não insista o tempo todo para que eu fale ou a escute, como se silêncio fosse falta de amor. Que quando estou com pouco dinheiro ela não me acuse de ter desperdiçado com bobagens em lugar de prover minha família. Que quando eu saio para o trabalho de manhã ela se despeça com alegria, sabendo que mesmo de longe eu continuo pensando nela. Que quando estou trabalhando ela não telefone a toda hora para cobrar alguma coisa que esqueci de fazer ou não tive tempo. Que não se insinue com minha secretária ou colega para descobrir se tenho amante. Que com ela eu também possa ter momentos de fraqueza e de ternura, me desarmar, me desnudar de alma, sem medo de ser criticado ou censurado: que ela seja minha parceira, não minha dependente nem meu juiz. Que cuide um pouco de mim como minha mulher, mas não como se eu fosse uma criança tola e ela a mãe, a mãe onipotente, que não me transforme em filho. Que mesmo com o tempo, os trabalhos, os sofrimentos e o peso do cotidiano, ela não perca o jeito terno e divertido que tanto me encantou quando a vi pela primeira vez. Que eu não sinta que me tornei desinteressante ou banal para ela, como se só os filhos e as vizinhas merecessem sua atenção e alegria. E que se erro, falho, esqueço, me distancio, me fecho demais, ou a machuco consciente ou inconscientemente, Ela saiba me chamar de volta com aquela ternura que só nela eu descobri, e desejei que não se perdesse nunca, mas me contagiasse e me tornasse mais feliz, menos solitário, e muito mais humano. (Copydesk/fragment by ES - Guardião Palavra)

quinta-feira, 17 de maio de 2018

ENTRE A ÁRVORE DA VIDA E O AMOR PLENO (*)

No interior de um trem, em imagens trepidantes de gravação caseira, a mulher diz ter renascido: ela vai à câmera, desliza pela mesa, cai, brinca e flerta com o companheiro. São imagens do cotidiano, do amor, de pessoas. Enquanto parecem nada fazer, tudo fazem. Elas vivem: seguem um caminho natural, enquanto o cineasta Terrence Malick tenta mostrar o quanto a vida pode ser bela, dura, e às vezes previsível. Sua mulher é a chave de Amor Pleno. Ela era também a chave de A Árvore da Vida: a mãe que traz para si o espírito, a paixão do filho, o contraponto ao pai bruto. Malick é um sábio: consegue converter Olga Kurylenko em uma mulher completa (ou quase) enquanto esculpe Ben Affleck como uma personagem de cinema mudo. Ele não precisa falar. Move-se. É duro, um homem de botas sujas, um homem que poderia deixar uma mulher à beira da estrada ao descobrir a traição dela. E deixará. Amor Pleno, fácil definir, é sobre o amor. Malick vai além: é sobre os desdobramentos do amor e a impressão de que nada, nesse mundo doente, pode ser pleno. O título nacional, assim, joga um pouco a favor do otimismo. A eternidade tem a ver com o espírito, com o sobrenatural, mas algo prende as personagens à materialidade. A mulher, Marina (Kurylenko), ama Neil (Affleck). Eles estão em viagem por terras distantes: aparentemente comuns a ela e estranhas a ele. Ela tem uma filha e já foi casada. O homem desapareceu como poeira no vento. A certa altura, Neil convida a mulher e a filha para seguirem aos Estados Unidos, à terra das oportunidades. Há sempre uma barreira. Também uma forma a sobrepor outra: a água que invade lentamente o campo da areia, as folhas secas e mortas que caem sobre a grama verde, o avião que corta o céu e deixa sua marca, a máquina que perfura o chão. Em jogo estão as questões da terra, questões materiais. Não custa muito lembrar a obra-prima de Malick, Cinzas no Paraíso, em que uma nuvem de gafanhotos destrói tudo ao fim, dando cabo de certo sonho humano. Ao mesmo tempo bíblico e material. O problema da terra, em Amor Pleno, tem a ver com o homem, e está de passagem. Em determinado ponto, descobre-se a contaminação da água – por consequência, da vida. O relacionamento de Marina e Neil, em paralelo, não anda bem: o visto dela vence e, em um táxi, simplesmente vai embora. Como poeira no vento. O que Malick traduz, ainda de maneira mais evidente que em A Árvore da Vida, é a fragilidade, a facilidade em se quebrar, em se sobrepor a algo, em se deixar levar às vezes pelo inexplicável. Ao mesmo tempo fortes, as personagens estão em dúvida: flutuam em sonho, nunca prontas para o mundo verdadeiro. A fotografia é do ótimo Emmanuel Lubezki, o mesmo de A Árvore da Vida. Pelas questões visuais, pelo rigor com o qual Malick tudo trata, é como se executasse, consciente, uma continuação de sua obra anterior. A origem da vida e o lugar de cada um no mundo ficaram para trás: suas personagens recaem agora ao amor, não apenas ao próximo, mas também a Deus. Brota disso o questionamento: pode ser eterno? Há um padre em dúvida, vivido por Javier Bardem. Na prisão, ele leva a comunhão aos detentos pelo pequeno vão da porta metálica. Ele – como as outras personagens de Malick – caminha sem caminho: pela rua, à sombra, embaixo das árvores, à porta de uma pessoa, falando com os outros sem falar muito, melancólico. As criações humanas de Malick parecem se repetir: delas, a vida surge de outra forma, como se mostrassem, em pele, o espírito. Isso é possível a partir de sua direção, na busca por belas imagens, às vezes nos mesmo locais em que esteve, antes, em A Árvore da Vida. Alguns momentos se repetem, até mesmo os enquadramentos. A vida se define às vezes pelo ciclo, pela repetição: eles conhecem-se, amam-se, casam-se, têm filhos. Não há muito a fazer senão crer na eternidade. É uma esperança, um remédio. (*) EUGENIO SANTANA é escritor, jornalista, ensaísta, redator publicitário e palestrante motivacional. Nove livros publicados. Membro da Academia Cachoeirense de Letras (ACL) e do Centro Cultural, Literário e Artístico de Portugal; sócio da ACI - Associação Catarinense de Imprensa e da UBE/SC - União Brasileira de Escritores. email: autoreugeniosantana9@gmail.com e WhatsApp (41) 99547-0100

quarta-feira, 16 de maio de 2018

RELAÇÕES VIRTUAIS (*)

Por que nos defendemos tanto da realidade, do olho no olho, das conversas (difíceis, sim, mas absolutamente necessárias)? Por que preferimos a fantasia e a distância a ter de nos mostrar, falar de nossos medos e desejos para a pessoa que dorme ao nosso lado? Creio que mais do que rotularmos como traidor aquele que mantém relações virtuais, ou traído por descobrir tal rota de fuga do parceiro, conseguiríamos respostas e resultados muito melhores se nos dispuséssemos a olhar para o que realmente está acontecendo em nossa relação real, no dia-a-dia, na comodidade da rotina, na desculpa da falta de tempo... Passamos horas e horas, madrugadas inteiras diante do computador, mas algo terrível acontece que não conseguimos dispor de meia hora para acariciar o outro e tentar iniciar uma conversa amigável e agradável... Definitivamente, uma verdade terei de admitir: é infinitamente mais fácil alimentar uma relação sem cheiro, sem toque, sem alteração de humor, sem a cobrança da presença, do olhar, da palavra embalada pelo tom, do que nos dispor a recomeçar, a fazer uma terapia, a rever nossos próprios atos e a perceber que também temos errado continuamente. Mas fica a questão: as relações virtuais são realmente capazes de nos preencher ou são, sobretudo, a sentença de nossa covardia diante da relação que temos vivido, não gostado, mas que não fazemos nada para mudar?!? Se você mantém uma relação virtual, sugiro que você ao menos desligue o computador por uma noite e olhe para a sua realidade. Sente-se na cama, segure a mão desta pessoa que dorme com você e atreva-se a dizer: o que é que tem acontecido com o amor da gente?!? Por onde ele anda? Será que conseguimos trazê-lo de volta, considerando tudo o que já vivemos, já construímos e o tanto que desejamos ser felizes?!? E se você descobriu que a pessoa amada mantém relações virtuais, sugiro que você apazigúe seu ego e deixe seu coração falar... Aproxime-se e arrisque uma declaração verdadeira e não uma pedrada. Talvez uma confissão: tenho sentido tanto a sua falta, ultimamente. Gostaria de ao menos poder conversar, saber o que anda acontecendo na sua vida. Talvez, assim, possamos resgatar o amor que já foi tão grande e tão forte entre nós... Cara!!! Vou te dizer! Eu sei que é muito difícil fazer isso!!! Mas você tem duas opções: ou toma uma atitude para tentar salvar a sua relação real... ou afoga-se na ilusão depressiva de que alguém que você nunca viu possa te amar mais do que esta pessoa que está ao seu lado... Porque o fato é que ninguém existe sem ser tocado, sem ser visto, sem ser compartilhado... e isso é absolutamente impossível no mundo virtual. Relações virtuais podem ser uma ótima medida paliativa, mas jamais será o que o seu coração realmente deseja! (*) Eugenio Santana – Jornalista, escritor, publicitário, ensaísta, biógrafo, relações públicas, assessor de comunicação e palestrante motivacional. Nove livros publicados. 41 - 99547-0100 (WhatsApp). Atualmente, radicado em Curitiba, PR.

segunda-feira, 14 de maio de 2018

A INSACIÁVEL FOME DO AMOR...

O amor comeu minhas roupas, meus lenços, minhas camisas. O amor comeu metros e metros de gravatas. O amor comeu a medida de meus ternos, o número de meus sapatos, o tamanho de meus chapéus. O amor comeu minha altura, meu peso, a cor de meus olhos e de meus cabelos. O amor comeu meus remédios, minhas receitas médicas, minhas dietas. Comeu minhas aspirinas, minhas ondas-curtas, meus raios-X. Comeu meus testes mentais, meus exames de urina. O amor comeu na estante todos os meus livros de poesia. Comeu em meus livros de prosa as citações em verso. Comeu no dicionário as palavras que poderiam se juntar em versos. Faminto, o amor devorou os utensílios de meu uso: pente, navalha, escovas, tesouras de unhas, canivete. Faminto ainda, o amor devorou o uso de meus utensílios: meus banhos frios, a ópera cantada no banheiro, o aquecedor de água de fogo morto mas que parecia uma usina. O amor comeu meu nome, minha identidade, meu retrato. O amor comeu minha certidão de idade, minha genealogia, meu endereço. O amor comeu meus cartões de visita. O amor veio e comeu todos os papéis onde eu escrevera meu nome. O amor voltou para comer os papéis onde irrefletidamente eu tornara a escrever meu nome. O amor roeu minha infância, de dedos sujos de tinta, cabelo caindo nos olhos, botinas nunca engraxadas. O amor roeu o menino esquivo, sempre nos cantos, e que riscava os livros, mordia o lápis, andava na rua chutando pedras. Roeu as conversas, junto à bomba de gasolina do largo, com os primos que tudo sabiam sobre passarinhos, sobre uma mulher, sobre marcas de automóvel. O amor comeu meu Estado e minha cidade. Drenou a água morta dos mangues, aboliu a maré. Comeu os mangues crespos e de folhas duras, comeu o verde ácido das plantas de cana cobrindo os morros regulares, cortados pelas barreiras vermelhas, pelo trenzinho preto, pelas chaminés. Comeu o cheiro de cana cortada e o cheiro de maresia. Comeu até essas coisas de que eu desesperava por não saber falar delas em verso. O amor comeu até os dias ainda não anunciados nas folhinhas. Comeu os minutos de adiantamento de meu relógio, os anos que as linhas de minha mão asseguravam. Comeu o futuro grande atleta, o futuro grande poeta. Comeu as futuras viagens em volta da terra, as futuras estantes em volta da sala. O amor comeu minha paz e minha guerra. Meu dia e minha noite. Meu inverno e meu verão. Comeu meu silêncio, minha dor de cabeça, meu medo da morte. (copydesk/fragment by ES - Guardião da Palavra)

sábado, 5 de maio de 2018

O FATOR EDIPIANO: RELACIONAMENTO ÍNTIMO COM A MÃE (*)

Segundo o mestre da psicanálise, Sigmund Freud, o período característico da luta edipiana costuma ser localizado entre os três e os seis anos de idade. Desde seu nascimento, o bebê mantém um relacionamento extremamente íntimo com sua mãe. Depende dela para tudo e, inicialmente, tende a encará-la como uma espécie de prolongamento de suas próprias necessidades. Aos poucos, contudo, aprende a vê-la como uma pessoa separada dele. Separada e diferente: ela não tem pênis; e papai tem. Entre os dois anos e meio e os três seu interesse pelo próprio pênis aumenta consideravelmente. Tornam-se comuns as observações orgulhosas do tipo “olha o meu pintinho, como é grande”. A masturbação é muito comum nessa fase, produzindo prazer e excitação evidentes. O menino continua muito apegado à mãe e, com o começo da fase edipiana, seu afeto expande-se num amor intenso e apaixonado, que inclui sensações centralizadas nos órgãos sexuais. Provavelmente, não tem uma ideia muito clara sobre o aspecto sexual do relacionamento entre seus pais, mas sente que existe entre os dois um segredo perturbador. E relaciona esse segredo, do qual é excluído, com sua excitação genital. Tem grande curiosidade a respeito da origem dos bebês – de onde vêm, como chegam ao mundo. Talvez faça centenas de perguntas concernentes ao assunto, sem que as respostas o satisfaçam inteiramente, pois é incapaz de expressar suas dúvidas sobre os problemas que realmente o preocupam. O amor do menino pela mãe, nessa fase, é extremamente exclusivista. Ele quer afastar todos os “rivais”, ou seja, os irmãos e o pai. Este, devido ao seu relacionamento especial com a mãe, concentra o ciúme e os impulsos agressivos da criança. Contudo, sua raiva entra em conflito com os sentimentos de amor e admiração que ela nutre pelo pai. Também teme que seus impulsos violentos provoquem represálias. O fato de relacionar a excitação genital com o intenso sentimento possessivo dirigido à mãe faz com que o menino atribua a essa excitação qualquer ameaça de represália por parte do pai. Via de consequência, ele teme perder o seu precioso pênis. Já observou que certas pessoas não têm pênis – a mãe e as meninas – e isto o convence de que pode perder o seu. Quanto mais intensa for sua paixão pela mãe, e os sentimentos de hostilidade pelo pai, tanto maior e mais real será seu medo de castração. Projeta sobre o pai os próprios desejos destrutivos, e se convence de que tem bons motivos para odiá-lo. (*) por EUGENIO SANTANA, Jornalista, Escritor, Ensaísta, Relações públicas, Publicitário e Analista de Marketing digital. Pertence à Academia de Letras de Uruguaiana-RS, UBE-GO/SC - União Brasileira de Escritores. Autor de nove livros publicados. Coordenador executivo da Sampa Publicidade Editora. E-mail: autoreugeniosantana9@gmail.com - WhatsApp: (41) 99547-0100