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sábado, 24 de outubro de 2020
A MULHER DESEJA CAUSAR UMA EMOÇÃO ERÓTICA INDELÉVEL EM CADA HOMEM (*)
Nos homens, após o ato sexual, há em geral um decréscimo de interesse pela mulher. É um fenômeno que tem muitas gradações, muitas nuances. Está apenas esboçado no homem apaixonado que abraça com força a amada, como se não quisesse mais separar-se dela. Atinge seu ponto máximo no relacionamento com a prostituta porque, neste caso, o desejo desaparece imediatamente, e o homem gostaria de já se ver vestido, fora do quarto, fora do hotel, fora do motel, bem longe. A mulher interpreta esse comportamento como rejeição, desinteresse. Sente-se tratada como um alimento delicioso que provoca grande desejo antes de ser saboreado, mas que depois, quando já se está saciado, torna-se enjoativo. Só que ela não é um alimento, é uma pessoa. O homem, antes, a cortejava, mimava, desejava. Não queria sentir seu desejo, admirava sua inteligência. Queria conversar com ela, conhecer sua história, participar de sua vida, fazer projetos. Depois do orgasmo - ou de um certo número de orgasmos -, é como se ela desaparecesse como pessoa, restando apenas um corpo rejeitado. O desejo da mulher de permanecer ao lado do homem depois do orgasmo (ou orgasmos) é muito mais forte quando ela está apaixonada. Contudo, existe sempre, desde que aquele homem lhe agrade. Isso porque o orgasmo da mulher é mais prolongado, mas, acima de tudo, porque ela sente a necessidade de ser desejada, de agradar de modo contínuo, duradouro. Simone de Beauvoir escreveu páginas cáusticas sobre a necessidade da mulher de ter a seu lado, fisicamente, o homem amado. "A essência", escreve ela, "é sempre uma tortura... mesmo sentado a seu lado, enquanto lê ou escreve, ele a abandona, a trai. Ela odeia seu sono". Simone de Beauvoir e as feministas explicam esse comportamento com o fato de que a mulher é obrigada, pela sua condição social, à passividade. Somente o homem é ativo. Ela procura, então, através do amor, englobar a atividade do homem para poder estar em seu mundo. Procura a fusão com ele para sair de sua maneira de ser incompleta. Quando ele parte, quando a deixa, sente-se perdida, porque sem ele não é nada. Mas esse estado de coisas - seundo Beauvoir - está destinado a desaparecer, quando também a mulher tiver conquistado sua autonomia e sua atividade. Então, mesmo que o homem esteja longe, não se sentirá mais vazia. A mulher quer sentir a presença física de seu homem, sentir as mãos dele sobre sua pele, a força doce e acolhedora de seu abraço, seu cheiro, a mistura dos cheiros que se torna perfume. Quer ouvir sua voz profunda a chamá-la. Quer sentir a aspereza de seus pêlos, o peso de seu corpo, a força delicada de sua mão, o leve contato de entendimento entre seus dedos, o furtivo tocar-se que renova a declaração de amor de maneira, infinitamente melhor que quaisquer palavras. Tudo isso acontece sob o registro da continuidade. Continuidade de ternura, carícias, palavras, penetração, sussurro. Imenso mar em que as sensações se sucedem como ondas, transformando-se umas nas outras. Continuidade nas metamorfoses. Continuidade dos corpos, das peles, dos músculos, dos odores, olores, dos passos, das sombras ao crepúsculo, dos rostos. Continuidade do desejo, da atenção, da excitação, da ternura, da paixão, do cuidado. E, a seguir, desejo de estar junto, de conviver, de participar das mesmas experiências, de ver as mesmas coisas, a mesma lua, as mesmas nuvens, o mesmo mar, de respirar o mesmo ar, de ter a mesma vida. Nas publicações lidas principalmente pelas mulheres, ao lado dos romances cor-de-rosa e das seções de moda e beleza, estão as histórias dos artistas. Os homens não se interessam pela vida privada dos astros, não participam de seus casos de amor. A eles interessa o ator, o cantor, o seu desempenho como tal, mas não o que ele é na vida particular, terminado o espetáculo, em casa com a mulher ou com suas amantes. À mulher, ao contrário, é exatamente isso o que interessa. O fanatismo ou o culto pelos artistas é, portanto, um fenômeno feminino. Ele é o produto, por um lado, do espetáculo, por outro, dos jornais e TVs que falam da vida pessoal do ator ou do cantor. O astro é o objeto escolhido da fofoca, da intriga coletiva. Não há nada semelhante no mundo masculino. O rapaz pode adorar uma cantora, pode até se sentir excitado eroticamente por ela, desejá-la. Mas dificilmente perde a cabeça a ponto de desvalorizar todas as outras mulheres. A mulher fanatizada pelo artista, ao contrário, vê na sua frente apenas ele, e os homens comuns parecem-lhe totalmente sem qualidades, insignificantes. O mesmo acontece com relação a personagens dotadas de poder, particularmente os líderes carismáticos. O homem adora o líder, mas seu amor é totalmente deserotizado. Na mulher, ao contrário, o relacionamento com o líder torna-se facilmente erótico. Em todos os movimentos coletivos, antigos e modernos, ao redor do líder existiu uma corte de mulheres sexualmente disponíveis. A mulher é atraída pelo homem capaz de proporcionar emoções violentas, amor apaixonado. É atraída pelo homem capaz de sentir e de querer, pelo homem que se atira numa aventura amorosa com decisão, com coragem. Esse desejo é o corrrespondente exato da fantasia de sedução. A mulher deseja causar uma emoção erótica indelével em cada homem. A mulher, portanto, aceita o corpo do homem pouco a pouco, gradualmente, através do amor. O homem amado, então, não é mais o animal predador que penetrou em seu corpo, que se satisfez, que dorme saciado. É como um menino que se entregou ao sono como se entregou ao amor, por efeito do seu amor. Não é mais a vítima, mas a caçadora. Sente o orgulho de Diana que lançou sua flecha e agora olha sua vítima inerte, e sente-se recompensada. Então adormece ao lado daquele corpo relaxado, inocente, que deve proteger. O corpo do homem amado não está mais separado. Ela está deitada, reclinada em seus braços e aspira seu hálito. Seu hálito é como o ar, indispensável. Seus odores se fundem, constituem um único olor, um único perfume. Sente o perfume penetrar pelas narinas certa de estar em paz com a vida. Tocá-lo é, então, o mesmo que tocar uma zona maravilhosa, quieta. É a certeza do contínuo, do permanente. Da eternidade.
(*) EUGENIO SANTANA é escritor, jornalista, gestor editorial, biógrafo, redator publicitário, ensaísta, poeta e romancista. Autor de 14 livros publicados e 18 prêmios literários de projeção nacional. (62) 9.8154-9077 WhatsApp
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