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domingo, 8 de abril de 2012
ENSAIO SOBRE A IDADE MÉDIA
O clima denso e tenso da Idade Média sempre me fascinou: os contrastes violentos, a vida dos camponeses e dos senhores feudais, as catedrais, as cruzadas, clero, a corte, os mosteiros, a pestilência, os sofrimentos, as trevas, a luz, e o sangue jorrados por quase mil anos.
Aprecio poemas e livros em que os costumes, as cenas criam-se com objetos, utensílios, palavras e expressões que poderiam estar ligadas à Idade Média, como estas que pesquisei num livro de história: teares; moinhos; moringas; batedores; hastes secas de linho; rebanhos e pastores; pátios de castelo; ervilhas, lentilhas e feijões; arado; chuvas de abril; falcões; panos de lã; couro de Córdova; pastéis de cotovia; alfaiates, boticários, ourives e monges.
Sinto um clima assim neste poema “A Hóspede”, de Guilherme de Almeida:
“Não precisas bater quando chegares.
Toma a chave de ferro que encontrares
Sobre o pilar, ao lado da cancela,
E abre com ela
A porta baixa, antiga e silenciosa.
Entra. Aí tens a poltrona, o livro, a rosa,
O cântaro de barro e o pão de trigo.
O cão amigo
Pousará nos teus joelhos a cabeça.
Deixa que a noite, vagarosa, desça.
Cheiram a relva e sol, na arca e nos quartos,
Os linhos fartos,
E cheira a lar o azeite da candeia.
Dorme. Sonha. Desperta. Da colméia
Nasce a manhã de mel contra a janela.
Fecha a cancela
E vai. Há sol nos frutos dos pomares.
Não olhes para trás quando tomares
O caminho sonâmbulo que desce.
Caminha – e esquece.”
Fica claro que quando falo em “Idade Média” ou “Idade da Fé” não estou me referindo exclusivamente a um período espacial, temporal, mas a um certo “clima”, valores, lembranças e imagens insondáveis do passado, retidos há séculos na noite da memória, no inconsciente coletivo. Esse “clima”, ao contrário, faz com que não existam delimitações espaciais ou temporais, tudo poderia ter acontecido ontem ou estar acontecendo agora, em qualquer parte do universo. Nessa região de neblina mágica é que desejo penetrar para revigorar o meu trabalho literário.
(Copydesk/fragment/releitura by Eugenio Santana, escritor, jornalista, ensaísta)