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terça-feira, 6 de julho de 2021

VAGALUMES NO JARDIM (*)

Os primeiros vagalumes começavam no bojo da mata a correr suas lâmpadas divinas. No alto, as estrelas miúdas e sucessivas principiavam também a iluminar. Os pirilampos iam-se multiplicando dentro da floresta, insensivelmente brotavam silenciosos e inumeráveis nos troncos das árvores, como se as raízes se abrissem em pontos luminosos. A desgraçada, abatida por um grande torpor, pouco a pouco foi vencida pelo sono; e deitada às plantas da árvore, começou a dormir… Serenavam aquelas primeiras ânsias da Natureza, ao penetrar no mistério da noite. O que havia de vago, de indistinto, no desenho das coisas, transformava-se em límpida nitidez. As montanhas acalmavam-se na imobilidade perpétua; as árvores esparsas na várzea perdiam o aspecto de fantasmas desvairados… No ar luminoso tudo retomava a fisionomia impassível. Os pirilampos já não voavam, e miríades deles cobriam os troncos das árvores, que faiscavam cravados de diamantes e topázios. Era uma iluminação deslumbrante e gloriosa dentro da mata tropical, e os fogos dos vagalumes espalhavam aí uma claridade verde, sobre a qual passavam camadas de ondas amarelas, alaranjadas e brandamente azuis. As figuras das árvores desenhavam-se envoltas numa fosforescência zodiacal. E os pirilampos se incrustavam nas folhas e aqui, ali e além, mesclados com os pontos escuros, cintilavam esmeraldas, safiras, rubis, ametistas e as mais pedras que guardam parcelas das cores divinas e eternas. Ao poder dessa luz o mundo era um silêncio religioso, não se ouvia mais o agouro dos pássaros da morte; o vento que agita e perturba, calara-se… Marcela foi cercada pelos pirilampos que vinham cobrir o pé da árvore em que adormecera. A sua imobilidade era absoluta, e assim ela recebeu num halo dourado a cercadura triunfal; e interrompendo a combinação luminosa da mata, a epiderme da mulher desmaiada, translúcida, era como uma opala incrustrada no seio verde de uma esmeralda. Depois os vagalumes incontáveis cobriram-na, os andrajos desapareceram numa profusão infinita de pedrarias, e a miserável, vestida de pirilampos, dormindo imperturbável como tocada de uma obra divina, parecia partir para uma festa fantástica no céu, para um noivado com Deus… E os pirilampos desciam em maior quantidade sobre ela, como lágrimas de estrelas. Sobre a cabeça dourada brilhavam reflexos azulados, violáceos, e dali a pouco braços, mãos, colo, cabelos, sumiam-se no montão de fogo inocente. E vagalumes vinham mais e mais, como se a floresta se desmanchasse roda numa pulverização de luz, caindo sobre o corpo de Marcela até o sepultarem em um túmulo insólito. Um momento, a mulher inquieta ergueu docemente a cabeça, abriu os olhos que se deslumbraram. Pirilampos espantados faíscavam relâmpagos de cores… Marcela pensou que o sonho alado a levara ao abismo esverdeado pelas luzes de vagalumes no jardim e como uma flor-estrela recaiu adormecida na face iluminada do Planeta blue… (*)EUGENIO SANTANA é Escritor, Jornalista, Ensaísta, Redator publicitário, Biógrafo, Editor executivo, Agente literário. Autor de 14 livros publicados. "Ventos fortes, Raízes profundas", "Hóspede da Terra, Passageiro do Mundo", entre outros. (41) 9.9909-8795 - es.escritor1199@gmail.com

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