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quarta-feira, 24 de fevereiro de 2021

ESCRITOR SEM ROSTO (*)

Nascido em Long Island, o escritor sem rosto estudou engenharia aeronáutica na Universidade de Cornell, deixando o curso ao ser convocado pela Marinha. Nas Forças Armadas tirou as fotos que até hoje são divulgadas como as únicas do autor (a Marinha forneceu outros materiais para seus livros). Quando voltou do serviço militar, trocou seus estudos para inglês em Cornell e teve aulas com o escritor Vladimir Nabokov, autor de Lolita. Após um curto período trabalhando com escrita técnica, entrou para o mundo da ficção e desapareceu por completo. Se por um lado faltam informações a seu respeito, por outro sobram especulações e teorias levemente delirantes sobre Thomas Pynchon. A mais inusitada afirma que o escritor seria o novo nome adotado por Jim Morrison (1943-1971), vocalista da banda californiana The Doors, vivo e oculto sob outra identidade — afinal, ambos parecem ter os mesmos interesses em física, ocultismo, matemática e cultura pop. Outros afirmam ser Bob Dylan ou ainda o terrorista Unabomber o homem por trás da figura misteriosa de Pynchon, e por aí vai. O culto a sua personalidade acaba sendo um magnífico diferencial na literatura contemporânea, mesmo entre notórios reclusos, como J. D. Salinger, de O Apanhador no Campo de Centeio, J. M. Coetzee, prêmio Nobel sul-africano, e os nacionais Dalton Trevisan e Rubem Fonseca. Este último, aliás, é amigo de Pynchon. Para Fonseca, ele escreveu o prefácio da edição americana da coletânea de contos O Cobrador. Não é de todo raro encontrar nos Estados Unidos e em outros países grupos de leitores devotos de Pynchon, reunidos para dissecar cada linha da obra do escritor e verificar seus mecanismos ocultos. O editor e escritor gaúcho Antônio Xerxenesky é um desses leitores aficionados pela obra do escritor, já tendo lido todos os seus livros, incluindo a coletânea de contos Slow Learner, cuja introdução contém as poucas informações oficiais disponíveis sobre sua infância e juventude. Para Xerxenesky, Pynchon ganha pouco se expondo: “A obra dele ganha muito com esse silêncio midiático, com referências obscuras, e perderia a graça se ele precisasse vir a público toda vez se explicar. Certamente, não haveriam leitores reunindo-se ao redor de seus livros se fosse assim”. Embora sua figura anônima seja fascinante, o editor afirma que ela não se sustentaria sem a qualidade excepcional do texto. “A gente fica curioso para descobrir quem é a mente doentia que criou esses universos tão fenomenais, e não podemos, e a graça está nisso.” O editor de Pynchon no Brasil, André Conti, da Companhia das Letras, nunca entrou em contato com o escritor, tratando tudo com seus tradutores (leia mais na matéria ao lado) e agentes. Para ele, a obscuridade da persona do autor de Contra o Dia é condizente com o universo criado por ele. “Se há algo em comum às obras do Pynchon é o fato de tudo ser permeado por um clima de desconfiança, paranoia sobre entidades conspiratórias. E nada melhor para falar sobre isso do que um autor recluso, igualmente desconfiado. É como se ele vivesse dentro daquilo, e os leitores se empolgam em suas vocações detetivescas para tentar descobrir não só significados ocultos em seus livros mas também qualquer informação sobre sua figura”. Sobre sua reclsuão, Conti conclui com um conhecido clichê literário que não poderia ser melhor aplicado a Pynchon: “O livro precisa falar por si só”." (*) EUGENIO SANTANA é escritor, jornalista, ensaísta, redator publicitário, agente literário, biógrafo, copidesque, revisor de texto e gestor editorial. Autor de 14 livros publicados: "Hóspede da Terra, Passageiro do Mundo", "Ventos Fortes, Raízes Profundas", Madras editora, entre outros. (41) 9.9909-8795 WhatsApp - email: es.escritor1199@gmail.com

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