terça-feira, 28 de fevereiro de 2017

APRESENTAÇÃO DO LIVRO "FLOR DE MARACUJÁ" (*)

Inventário de luz, cor, olor, cicatriz, dor, Amor! Perfume das flores no jardim de um templo gótico. Mística visão da Mesquitazul. Istambul... Vida e poesia mesclam-se no mesmo movimento rumo à transcendência. Multiforme face desnuda infinitos. “Flor de Maracujá” é pura alquimia de poesia-magia. Poeta-fênix de Vôo solitário e majestoso que aprendeu a duras penas as lições, luta na mais sublime guerra, uma guerra santa chamada Amor à Poesia. Deves aprender, primeiramente, a abrir os olhos e a enxergar. Deves ver não só aquilo que te agrada, mas também o vil excremento. Deves olhar com o mesmo prazer uma orquídea negra, uma rosazul, uma tulipa amarela, um lírio lilás e um escorpião escarlate... Através da vidraça meus ígneos e rúbidos olhos imploram o teu amor! Olhares e janelas... Violetas invioláveis no Outono... Deves olhar não só o muro, mas também sua altura. Vê quão lodosa pode ser uma Lagoa... Visualize, então, a Flor-de-Lótus e experimente aspirar o perfume de tua almalada. Poeta-fênix: com tuas garras, deves aprender a rasgar a carne impura, com teu olhar deves queimar o hálito fétido do mundo. Aprende também a sentir o odor melancólico das Flores mortas, a adorar as lágrimas argênteas, a construir um singelo templo de murmúrios. Assim te tornarás capaz. Louva aquilo que é bom e justo, com teu cântico de “Bem-Querer às Violetas”, canta a imensidão do céu azul e recorda-te como pode ainda ser bela a natureza humana... “Flor de Maracujá”: Flor-Essência; florescências... Viajo nas Asas difusas do Tempo e recordo as quaresmeiras floridas nos cerrados de Paracatu, Unaí, Araxá, Luziânia, Cristalina, Pirenópolis, Goiânia, Anápolis, Brasília... Reminiscências de Pássaros, Peixes e Flores. Saudades de percorrer e revisitar o jardim cósmico de minha amada mãe Adília Santana... Mergulho nas águas diáfanas da infância adormecida nas palmeiras seculares que adornam a Catedral Matriz de Santo Antônio... Voláteis buritis nas Asas da Memória! Caminho na Floresta e não e não encontro duendes, gnomos e fadas que me falem da beleza exótica e enigmática da misteriosa Rosazul... Rara flor das oníricas lembranças. Sonhos inefáveis e inalcançáveis. Laivos da mais pura ternura afloram dos espaços do coração-de-romã desta Poeta-fênix de profundos olhos oceânicos. Profundezas marítimas me instigam a navegar e mergulhar neste Mar de Luz Azulilás... Abelhinha indomável, me escondo no fundo e me embriago dentro das pétalas aladas da “Flor de Maracujá”. Após a imersão, retorno pleno e curado da Dor de Amar demasiadamente... Ah, Mar! Barco ébrio de meu alter-ego Rimbaud. Remo e Rima. Verso e canção. Musa-mulher: ensina-me a sina de “ser-poeta”; “escravo. Enquanto escrevo”. Plúmbea Neblina me espera no “Alto da Boa Vista”, vislumbro o bairro “bela vista”: Recife de corais. Cora. Coralina. Renasce a perplexidade nos olhos de Hórus. Às vezes oro; muitas vezes, choro. Lembranças de outras vidas, Marrocos, Arthur Rimbaud... Abre imperiosamente tuas asas, Poeta-fênix, lança um olhar aos céus e abandona-te ao sabor de oceânicas Ventanias. Certamente agora teus músculos têm o vigor imprescindível e teu coração e mente estão límpidos e puros, expurgados de qualquer lama, certamente agora poderás voar mais longe e mais alto. A poemagia de Rita de Cássia Alves sublima, encanta, eleva: zéfiro ao Zênite; êxtase e enlevo. Registro flashes do Absoluto. Sons vocálicos perdidos no espaço-tempo são resgatados por meio de uma guerreira sacerdotisa e pitonisa alquimista da Expressão Escrita. Palavras de Luz de um verbo singular... Rita. Poema-oásis de brilho raro; uma guardiã da poesia. Ensinas o ritual da longa espera de uma inspiração antológica. Nunca o planeta-blue e seus habitantes foram tão tristes e infelizes. É um paradoxo completo. Temos tudo e não temos nada, além de uma lancinante solidão entre as multidões. Viaja-se fora da Terra, dominam-se técnicas inimagináveis, mas no íntimo o fosso abissal abre-se cada vez mais. O ser humano é um elo perdido no cosmo. Nossa porção natureza está violada e distante. Rita sente uma atração “quase” irresistível pelo jogo de sonoridades, aproximação de palavras por similitude fonética e o apelo para o fluxo das janelas do mundo interior, que se coaduna com facilidade tanto com a sintaxe incomum quanto com o jogo sonoro. Através de tudo isso a nostalgia sutil como elemento unificador. Onde se insinua a Dor? Pelas fendas e Sendas do Amor. Rita de Cássia Alves carrega dentro de si um coração de diamante literalmente lapidado. Literariamente burilado. A poesia beija a “Flor de Maracujá” neste lírico amanhecer de outono, sob o olhar atento dos lírios amarelos que circundam de beleza a avenida principal de Joinville... Joinville-SC, 09/04/1999. (*) EUGENIO SANTANA é jornalista, escritor, ensaísta, influenciador digital e blogueiro. Membro efetivo da ALNM – Academia de Letras do Noroeste de Minas, cadeira dois. Membro Acadêmico “Benemérito Ad Honorem” do Centro Cultural, Literário e Artístico de Portugal; Autor de nove livros publicados

quinta-feira, 16 de fevereiro de 2017

DEUS É VENTO (*)

Quem somos? O intervalo entre o nosso desejo e aquilo que os desejos dos outros fizeram de nós. Procuro despir-me do que aprendi. Procuro esquecer-me do modo de lembrar que me ensinaram, e raspar a tinta com que me pintaram os sentidos, desencaixotar minhas emoções verdadeiras, desembrulhar-me e ser eu, não Eugenio Santana, mas um animal humano que a natureza produziu. Mas isso, triste de nós que trazemos a alma vestida!, isso exige um estudo profundo, uma aprendizagem de desaprender... Quero raspar as tatuagens de Deus com que cobriram os nossos corpos. Teólogos, sacerdotes, fiéis – todos eles se dedicam a essa arte perversa. Pensam que suas palavras são gaiolas para pegar Deus. Com isso ofendem Deus: pintam-no como pássaro engaiolável. Mas Deus é Vento – é isso que quer dizer a palavra “Espírito”- não pode ser engaiolado como passarinho. Em outras palavras: não adianta, quando a gaiola se fecha, é porque o sagrado já voou para outro lugar. Deus está sempre além das palavras, no lugar aonde as palavras não chegam, onde só existe o silêncio. As gaiolas de pegar Deus têm muitos nomes: rezas, terços, novenas, orações, preces, mantras, rituais, promessas, templos, Bíblia, Corão. Mas só os cegos não percebem que elas estão sempre vazias. O Rio cujo nome sabemos não é o eterno. O nome que pode ser dito não é o nome eterno. O Rio que não tem nome: dele nascem todos os rios que têm nome. O Rio que não tem nome é o princípio dos céus e da terra. Os rios que têm nome; neles nadam dez mil peixes diferentes. O caminho para Deus começa com o esquecimento de todos os nomes que nos foram ensinados. Deus não se vê diretamente. Só através de espelhos. Bons espelhos não têm memória. São vazios. A gente sai da frente deles, e prontamente de nós se esquecem. Se tivessem memória, eles guardariam o nosso rosto, mesmo na nossa ausência. Para refletir Deus em tudo o que aqui e agora existe, meu coração há de ser um espelho luminoso, claro e vazio. (*) EUGENIO SANTANA é escritor, autor de nove livros publicados, jornalista de mídia impressa, ensaísta, biógrafo e relações públicas. Membro efetivo da ALNM - Academia de Letras do Noroeste de Minas, sócio da UBE – União Brasileira de Escritores

quarta-feira, 15 de fevereiro de 2017

APÓS O CARNAVAL...

Os especialistas, economistas, jornalistas, políticos, líderes e estudiosos, nem eles sabem o que vai acontecer com o Brasil, com cada um de nós, os ricos e os pobres, os alegres e os desesperados, os descrentes e os iludidos, e os doentes em fila para atendimento médico, em fila para o seguro-desemprego, o abono do PIS e o FGTS inativo, em fila para receber o corpo do pai morto que sumiu – porque alguém está em greve e corpos apodrecem em algum corredor. Depois do Carnaval é que o ano vai realmente começar, isso é unanimidade. E aí, dizem também, vamos entender em que enrascada estamos, tendo de optar por comer ou pagar o aluguel, tomar banho frio ou desligar a TV o dia inteiro, ou comprar material escolar das crianças. Nada tenho contra o Carnaval, mas, quando vejo tantas pessoas sambando animadíssimas em tantas ruas há semanas, penso se isso tudo é despreocupação e alegria ou se há um pouco de alienação e desespero. Porque depois do Carnaval continuaremos a ficar todos mais pobres e endividados, e o Congresso – que deveria nos representar – voltará com suas confusões impensáveis, quem sabe pancadaria, baixaria, xingamentos, e pouca eficiência. O mundo anda mesmo esquisito, depois do Carnaval os estrangeiros que nos viram pela TV talvez achem que nossos problemas eram invenção da imprensa capitalista: não foi por alienação ou desespero, mas de felicidade que pulamos durante semanas pelas ruas e praças de um Brasil bem administrado, bem-sucedido, exemplo para os países respeitados que crescem, cujos líderes planejam e executam trabalhos em favor de seu povo, com esforço, competência e honradez. (Jornalista/escritor EUGENIO SANTANA)

domingo, 5 de fevereiro de 2017

O TEMPO (*)

Contei os meus anos e descobri que terei menos tempo para viver daqui para frente do que já vivi até agora. Tenho muito mais passado do que futuro. Sinto-me como aquele menino que recebeu uma bacia de jabuticabas. As primeiras, ele chupou com avidez, mas percebendo que faltam poucas, rói o caroço. Já não tenho tempo para lidar com mediocridades, não quero estar em reuniões onde desfilam egos inflados, inveja e desamor, orgulho e ambição. Inquieto-me com invejosos tentando destruir quem eles admiram, cobiçando seus lugares, talentos, sorte e criatividade. Já não tenho tempo para conversas prolixas e intermináveis, para debater assuntos inúteis sobre vidas alheias que nem fazem parte da minha história. Já não tenho tempo para administrar melindres de pessoas, que apesar da avançada idade cronológica são imaturas. Não suporto fazer avaliação de desafetos que brigaram pelo honorável cargo de Diretor de Jornalismo. As pessoas não debatem conteúdos, apenas os rótulos. Meu tempo tornou-se escasso para debater rótulos, quero a essência, minha alma alada tem urgência de ser feliz. Sem muitas jabuticabas na bacia, quero viver ao lado de gente humana, demasiadamente humana, que sabe rir de seus tropeços, que não se encanta com vitórias fáceis, não se considera eleita antes da hora, não foge de sua mortalidade, e que as mentiras e assuntos inacabados não façam parte do momento, quero caminhar perto de coisas e pessoas autênticas que saibam o que é o amor incondicional. O essencial faz a vida valer a pena. E para mim basta o essencial. (*) Copydesk/fragment by EUGENIO SANTANA, jornalista, escritor, ensaísta, biógrafo e redator publicitário. Membro efetivo da ALNM – Academia de Letras do Noroeste de Minas, cadeira dois. Membro Acadêmico “Benemérito Ad Honorem” do Centro Cultural, Literário e Artístico de Portugal; Autor de nove livros publicados

quarta-feira, 1 de fevereiro de 2017

FILAMENTOS DE UM PÔR-DO-SOL ANDRÓGINO (*)

Admirava-o. Não perdi a admiração. Acredito que ela tenha aumentado. O bizarro, é que nunca cheguei a pensar como tudo havia acontecido. Eu era, testemunha ocular de um gesto que personalizou-o, ainda que não tenha tido a intenção, seu trabalho bastaria, como bastou. Entre os estandartes da demência e da genialidade, fez-se eterno. O vermelho deslizava-lhe pelo pescoço, avolumando pequenas poças, coágulos, gosmas, querubins malditos, formas mortas, abortos, abutres, assentados nos pêlos da sua barba. Seu olhar fixo, sem nenhum tremor, como se nada acontecesse, e não fora ele o autor, intérprete, diretor, cenário e palco do monólogo vermelho. A colcha que cobria a cama ganhava nova coloração e forma, pintura primitiva, esvaindo-se das minas da carne, viscosa e quente, contrastando à indiferença do seu olhar, parede e alcova, da emoção. O corpo demonstrando declínio ante a dor não exposta e fraqueza natural, quedou-se devagarzinho, de encontro à cama. O instrumento cúmplice, banhado de vermelho, parecia um bumerangue aborígene, pássaro apocalíptico da trilogia da negligência. Nós éramos mórbidos epigramas do triângulo em gestação. Cortado pelo gélido pincel, foi-lhe a carne dividida, lembrando o pão da santa ceia, às avessas. Ela estava arrancada dele, definitivamente separados. Não fiz nada. Senti que não deveria interferir. No entanto, não poderia abandonar aquele momento trágico e sedutor, sem pegar um souvenir. Quanto tempo sonhei com aquela tarde no Louvre. Lá estava eu, entre dezenas de grandes mestres, todos fascinantes com seus estilos, e rupturas que marcaram época, contudo, queria encontrá-lo, devorá-lo ao vivo, longe das reproduções e slides, que durante anos foram companheiros nas salas de aula. Somente ele, nenhum outro, de tal forma, conseguia desequilibrar-me, colocando-me à deriva emocional. Diante da sua arte, caminhava entre as plantações de trigo, girassóis e moinhos. Nessa viagem, frenesi de quem parte sem ausentar-se, somente retornava a mim mesmo, quando os alunos em coro, chamavam-me. Andando pelos corredores do Louvre, escarnavam-me o olhar babando as gosmas saborosas das retinas, Delaroche, Velasquez, Picasso, Gaugain, Renoir, Monet, que provocou-me compreensível – breve – parada. Ele, de certa forma, bordava as lantejoulas do meu frenesi. Continuei a busca, com a certeza da sua proximidade. Subitamente, como se algo, chamasse-me a atenção, tocando-me às costas, virei-me, e o paraíso descerrou as cortinas – a luz amarela – estrela vésper da sua pintura, mergulhava na umidez vermelha dos meus olhos. Ignorando as pessoas em volta, perdendo com mais intensidade a noção do tempo, ao êxtase tântrico pictórico, minha alma alada, já não era alma. Era um arco-íris pousando no útero da tela, onde fiquei, até que uma voz – sempre elas – trouxe-me de volta para o outro lado – a terceira margem do rio do tempo – ao insistir que estava na hora de fechar o museu. Saindo do Louvre, meus olhos garimpavam o transe. Na indiscreta verticalidade do abismo, encontrei o metal cortante. Minhas náufragas, suadas digitais, revelaram a dissimulada atração. Ao guardá-lo, no bolso esquerdo da jaqueta, forte era a sensação de Ícaro, cujas asas a monotonia, não mais haveria de derreter. No balanço do meu andar, o metal batia e voltava sobre meu coração, como chibatadas, açoitando a dolorida ansiedade. A uma quadra do hotel, resolvi parar num café, escolhendo uma mesa na calçada. Após a primeira taça de vinho tinto seco, vejo-me novamente em seu quarto. Ele com o instrumento em riste, no topo da orelha, não ousava dizer absolutamente nada. Quedou silente. Os músculos de sua face e seus olhos eram os mesmos bailarinos paralíticos, completando a alegoria do hiato, antecedendo ao gesto. Sua mão, única expressão de vida, desceu num frêmito impulso guilhotinador. Um desejo irremovível de amputar. Em queda, as gotas de sangue eram filamentos de um pôr-do-sol andrógino. Sentado no café, o garçom perguntava-me se queria outra garrafa. Pedi a conta, ao mesmo tempo em que apalpava os bolsos da jaqueta. Chegando ao hotel, peguei a chave, tomei o elevador. Dentro do apartamento, ouvi o farfalhar das asas de dois pássaros vermelhos, fui ao lavabo, postei-me frente ao espelho, retirando, primeiro do bolso esquerdo da jaqueta, o dócil e inofensivo cortante metal. Depois foi a vez do souvenir. Ao empunhar o metal sobre minha orelha, no canto esquerdo superior do espelho, Van Gogh, observava-me passivamente. No mármore do banheiro, a orelha de Van Gogh, já não estava sozinha. (*) EUGENIO SANTANA é Jornalista, Escritor, Ensaísta, Biógrafo e Redator publicitário. Pertence à UBE - União Brasileira de Escritores. Colaborador da ADESG, AMORC e do Greenpeace. Autor de nove livros publicados. Gestor e fundador da Hórus/9 Editora e Diretor de Redação da Revista Panorama Goiano.